18 de março de 2006

Cidade Baixa, de Sérgio Machado

Os melhores de 2005.

Cidade Baixa, de Sérgio Machado

“E aí periguete, quer carona”. Assim começa a ligação de três almas perdidas nas vielas de uma cidade escondida, não turística, aquela habitada apenas pelos desafortunados que tentam se equilibrar no pouco ou quase nada a que estão acostumados; ao pouco ou quase nada que são.Mercenários de uma vida distante do imaginado pelo Brasil, na velha Salvador, distantes da alegria dos axés carnavais felizes. Nesta Bahia , encontramos três personagens perdidos entre si e jogados à beira do cais do porto, e em suas esquinas sujas e fétidas, onde se mistura cheiro de suor ordinário, temperado a trabalho bruto, sexo e porra. Onde se habita “galos e pretas” à procura de um sentido para suas malfadadas vidas.
Sérgio Machado, nos presenteia em sua estréia, com três destes exemplos. Vagner Moura, Lazaro Ramos e Alice Braga, formam um triangulo amoroso, ou melhor, sexual. Os dois rapazes, sócios e amigos de infância, vêem sua aparente estrutura “irmã” ruir quando se apaixonam, melhor dizer, desejam a bela Alice, que por sinal incendeia a tela. A partir daí, o equilíbrio, que na verdade nunca existiu, se perde, ou melhor, eles se perdem, entre eles mesmos. O sexo, o desejo e a violência, servem de válvula de escape à ternura, ao amor, coisas que nenhum teve ensinamento, são sobreviventes.
É visível como eles não sabem lidar com os sentimentos – quem é que sabe? – seja na amizade entre os homens, seja na paixão sentida dos dois pela puta. É como se os três se perguntassem “ O que fazemos com isso?”. Ah! Esse sentimento em ebulição dentro de nós, faca de dois gumes chamada paixão.
Enquanto isso, nós vemos a Cidade Baixa do título. Quase sentimos seus cheiros e fedores, o ar pesado do cabaré, suas bebidas baratas. Deus não existe nesses lugares, apenas o desejo e a violência, mola propulsora dessas almas sem destino. Sim, eles sabem que são sem destinos, espúrias da sociedade hipócrita, que não dá chances a quem nasceu sem nada.
Temos como exemplo, logo no início, as presenças de José Dummont (o maior ator do Brasil), junto aos outros, numa briga de galo, vêem a briga de galo em que ele é um apostador. Logo em seguida uma briga dele com o personagem de Lázaro Ramos, parece uma repetição da rinha entre os galos, pois na verdade homens/galos são a mesma coisa nessa atmosfera, são apenas máquinas de briga e sexo.
Sérgio Machado deixa generosamente seus atores brilharem, especialmente Alice Braga. Sentimos suas respirações e seus odores, de forma natural e ao mesmo tempo pungente como na cena final. Desconcertante.
Pinto, Porra, Porrada e Puta, numa Salvador sem salvação.

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